sexta-feira, 14 de janeiro de 2005

2005: Bem-vindo ao Ano Mundial da Física

Sei que falar em Física bem durante a época das férias escolares (e do vestibular!) pode dar urticária em muita gente, mas o assunto é inevitável: 2005 é o Ano Mundial da Física, escolhido por marcar o centenário da publicação dos trabalhos de Albert Einstein sobre a natureza da luz, sobre a relatividade restrita, a relação entre massa e energia – e algumas outras coisinhas.

Isso tudo pode soar muito abstrato, mas na verdade não é. Do trabalho Einstein sobre a luz nasceram os raios laser, CDs, DVDs e telas como essa aí, em que você lê este artigo. Da relação entre matéria e energia vieram os reatores e armas nucleares. Roubando uma metáfora do escritor americano Peter Galison, se as teorias fossem como nuvens e a prática, a tecnologia, como água, boa parte da Física seria uma neblina densa, transitando continuamente entre uma forma e outra.

É esse trânsito contínuo entre teoria e prática que dá margem àquilo que Einstein disse ser a coisa mais surpreendente do Universo: o fato de que é possível compreendê-lo. O que pode ser mais estranho do que saber que uma equação pode prever a velocidade com que uma bola cairá – não só em qualquer ponto da Terra, mas do Universo? E, no entanto, equações assim existem. E funcionam. Se não funcionassem, nossos prédios não parariam em pé. Nossos aviões cairiam todos (ou sequer decolariam). Nossos foguetes jamais teriam chegado à Lua. E os elevadores...

Mas, citando um velho clichê, familiaridade gera desprezo. Estamos tão acostumados com as maravilhas da Física (e da Química, e da Biologia, e da Matemática) que nos cercam que simplesmente paramos de nos espantar. Afinal, que tipo de maravilha é esse, que está sempre aí?

Mas o desprezo, mantido ao longo do tempo, no final cobra seu preço. Hoje, a maioria das pessoas, incluindo muita gente educada, com opiniões firmes e informadas sobre política, economia, futebol, literatura e cinema depende, para viver, de tecnologias baseadas em conceitos que desconhece e que talvez até contemple com um certo terror supersticioso.

Psicologicamente, pode não ser uma situação assim tão diferente da do homem das cavernas, que se via impotente diante dos caprichos dos deuses do fogo, da chuva, da caça e da noite.

E, se a situação não é diferente, as reações também não são: se o elétron que sai da tomada parece incompreensível, por que não podem existir outros enigmas, energias positivas e negativas, harmonias dos duendes, magnetismos dos anjos, o poder dos astros? O argumento a partir da ignorância – se eu não sei o que é, pode ser qualquer coisa – não tem lá muita força lógica, mas pode se mostrar bem persuasivo.
O fato, porém, é que embora a ignorância humana ainda seja abismal, hoje sabemos mais do que sabiam nossos ancestrais nas cavernas, nas ágoras gregas, na Idade Média, no Renascimento ou há cem anos. A perplexidade de Einstein talvez resuma a mensagem mais importante deste Ano Mundial da Física: o Universo às vezes é estranho, mas pode ser compreendido. Estamos trabalhando nisso. Tem muito conhecimento que já está aí. É só procurar.
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Fonte: Estadao.com.br

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